Ele largou a enxada no momento em que o toque
suave da garota chamou a sua atenção. Olhou-a do alto dos seus 1,90 e esperou
pacientemente pela pergunta. “Criança é um ser difícil de lidar” – costumava
dizer aos amigos mais íntimos. Ensaiou um gesto de impaciência, porém algo o
deteve. Ana o observava de uma forma diferente e trazia nos braços miúdos
algumas margaridinhas do campo. Esperou... e nada! Ela apenas o olhava!
O que queria a filha, afinal? O
olhar atento dela começou a incomodá-lo. “O que estaria aprontando esta
criaturinha insolente?” – uma voz interior deixou-o de sobreaviso. Quando o
silêncio lhe pareceu insuportável, ela sorriu de forma angelical. Isso o
irritou mais do que mil gritos ou um dos seus inúmeros porquês.
Como se guardasse um segredo, a criança lhe
alcançou uma braçada de margaridas... As pétalas ainda estavam úmidas devido à
chuva que caíra ao amanhecer. O gesto não o surpreendeu. A filha adorava
presenteá-lo com objetos inúteis! Aceitou as flores com displicência,
jogando-as ao solo rapidamente e retornou ao trabalho interrompido. Ela, no
entanto, cutucou-o com sofreguidão. Voltou-se, muito zangado:
- Filha, afinal, o que quer?
- Por que o adulto não sabe dar
valor às coisas simples? Essas margaridas...
- Sim, margaridas... que tem? Eu já
peguei o seu presente! Obrigado, filha!
Ela o olhou, mais uma vez, daquela forma
estranha, quase desafiadora, depois disse:
- Como irão entender as crianças,
pai? Os adultos sequer compreendem a beleza das flores... Afastou-se com os olhos
negros brilhantes de indignação e pena.
Para trás, deixou um homem pensativo, imerso
em reflexões. No chão, as margaridinhas jaziam... Solenes.
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