Pés em desalinho,
cachecol colado ao corpo,
olhos de coração...
saí ao encontro do meu amor...
Na rua,
folhas secas,
acenavam adeuses...
e o céu estrelado em nuvens
acariciou-me com seus longos
braços azuis...
Pés em desalinho,
cachecol colado ao corpo,
olhos de coração...
saí ao encontro do meu amor...
Na rua,
folhas secas,
acenavam adeuses...
e o céu estrelado em nuvens
acariciou-me com seus longos
braços azuis...
Olhou em silêncio para o espelho...
e a superfície fria lhe devolveu a imagem
de um rosto com nuanças de brumas...
" O tom escaldante do seu adeus é apenas
o reflexo amargo, doído
da face oculta...
que o espelho esconde."
As palavras cinzas pulsaram
na alma...
Já os olhos, pupilas de lágrimas,
transformaram-se em janelas...
e foi por onde meu ser escapuliu...
O ônibus chegou e eu
havia deixado o passado para traás...
Na alma, retalhos empoeirados de
uma existência costurada com linhas
farpadas...
Sentimetos nefastos e
sofrimentos algozes perderam-se...
no vazio longínquo...
Agora, o mundo era esperança azul
e as horas pincelavam metamorfoses...
O ônibus chegou e a vida
em pétalas abrira-se.
mais uma vez...
O sol se pôs no horizonte...
e o céu da tardinha
salpicou-se de tons alaranjados...
O dia morria em aquarela...
para que a noite ressuscitasse
em tons de prata e lua...
"Estrelou o escurecer!"
Da janela, em olhos de brisa,
observei a chegada dos perfumes
e sons noturnos...
Coração tranquilo, sorrisos fartos,
esperanças florescendo em pétalas ao vento.
A espera me encharcou de paz...
E o entardecer me cobriu
com seu manto protetor...
A menina brinca com uma boneca de pano
velha, suja, rasgada...
Os olhinhos da pobre menina brilham,
suas mãozinhas magras procuram trançar o cabelo da bruxinha...
Ela espera.
Os ternos lábios entreabertos, os dentinhos ainda alvos...
Talvez... esteja esperando por uma fada!
Inocência.
O mundo é cruel, não poupa ninguém...
"O que será da menininha que hoje brinca, embalada por doces
sonhos?"
A vida levará a menina por outros rumos... a pobreza é pungente...
Enquanto isso, ela brinca.
Mesmo não sabendo que o mundo, as pessoas, muitas vezes,
transformam o lírio em lama!
Por certo, ela ainda não sabe disso... não agora!
Vamos imaginá-la sempre ali: sentadinha, os meigos olhos,
os ternos lábios, as mãos magras, a candura do ato
de trançar os cabelos da bruxinha...
Sim, vamos deixá-la ali, sentadinha,
na sua singela... Inocência.
“Eu cato papel, mas não gosto. Então
eu penso: faz de conta que eu estou sonhando.” (Carolina Maria de Jesus)
** poema selecionado pela Revista Inversos, em homenagem à Escritora Carolina Maria de Jesus, Feira de Santana, Bahia
Queimaram
as
folhas de lavanda, o lilás virou breu...
fogo
vermelho e assassino nas pétalas cheirosas
de
hortelã...
Queimaram
os
caules suculentos das árvores sonhadoras
das
laranjeiras em flor...
Queimaram
os
cactos, estrelas pontiagudas e... os espinhos mormacentos
sucumbiram
à dor...
Queimaram
o
capim verde, suado dos pés calejados, mapas de sonhos, lutas e esmeraldas...
Queimaram
o
coração da mata, pulverizaram o voo alado
do
mágico beija-flor...
- Ah!
E o bem-te-vi!
Queimaram
as
águas murmurantes, doces... dos riachos dançantes...
- Ah!
Chora Iara, Mãe das Águas!
Queimaram
o lar
da onça pintada, do macaquinho inocente, da cutia vigilante,
das
formigas pensantes...
Queimaram
nossa natureza!
Condenaram
às lágrimas gerações inteiras...
** poema premiado na 2ª temporada Poemas da Terra Web tv
A
chuva cobrara presença. Lavara as calçadas, os postes, as paredes, o
guarda-noturno lá na esquina. No silêncio da manhã que desabrochara, nem mesmo
o bem-te-vi nos alegrara com sua cantilena.
O gato Frufru virara super-herói e
desafiara as poças d’água, em miados perversos e rancorosos. O céu cinzento se
tornara moldura perfeita para o dia nascente coroado de caos líquido.
O Manacá florido também tivera sua
cota de sofrimento: despencara em lágrimas saudosas. Restara o desfolhar.
O jardim antes aquarela se
ressentira com o aguaceiro. Chorara folhas arrancadas e mortas.
Se a natureza penara e vertia gotas opacas, o
mesmo se poderia dizer dos meus pés, metidos em chinelas aguadas.
O cenário se dissolvera em prantos
de chuva. Sobrara a desolação.
O frio e a tromba d’água compuseram
sua sonata. Amargor líquido. Amargura cinza. As nuvens não eram risonhas, eram
de algodão puído e velho.
Deus, se o beija-flor desse o ar de
sua graça e aquecesse minha alma com seu voejar... E a primavera me brindasse
com uma taça de champagne!
O céu já não seria mais sujo e
desbotado, tingir-se-ia de rosa.
Poema selecionado Revista Bsrbante abril 2024