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quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Margaridinhas - Conto

 




 



             Ele largou a enxada no momento em que o toque suave da garota chamou a sua atenção. Olhou-a do alto dos seus 1,90 e esperou pacientemente pela pergunta. “Criança é um ser difícil de lidar” – costumava dizer aos amigos mais íntimos. Ensaiou um gesto de impaciência, porém algo o deteve. Ana o observava de uma forma diferente e trazia nos braços miúdos algumas margaridinhas do campo. Esperou... e nada! Ela apenas o olhava!

            O que queria a filha, afinal? O olhar atento dela começou a incomodá-lo. “O que estaria aprontando esta criaturinha insolente?” – uma voz interior deixou-o de sobreaviso. Quando o silêncio lhe pareceu insuportável, ela sorriu de forma angelical. Isso o irritou mais do que mil gritos ou um dos seus inúmeros porquês.

             Como se guardasse um segredo, a criança lhe alcançou uma braçada de margaridas... As pétalas ainda estavam úmidas devido à chuva que caíra ao amanhecer. O gesto não o surpreendeu. A filha adorava presenteá-lo com objetos inúteis! Aceitou as flores com displicência, jogando-as ao solo rapidamente e retornou ao trabalho interrompido. Ela, no entanto, cutucou-o com sofreguidão. Voltou-se, muito zangado:

            - Filha, afinal, o que quer?

            - Por que o adulto não sabe dar valor às coisas simples? Essas margaridas...

            - Sim, margaridas... que tem? Eu já peguei o seu presente!  Obrigado, filha!

            Ela o olhou, mais uma vez, daquela forma estranha, quase desafiadora, depois disse:

            - Como irão entender as crianças, pai? Os adultos sequer compreendem a beleza das flores... Afastou-se com os olhos negros brilhantes de indignação e pena.

             Para trás, deixou um homem pensativo, imerso em reflexões. No chão, as margaridinhas jaziam... Solenes.

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