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sábado, 17 de julho de 2021

Recordações- conto

 

 

 

            O circo sempre me despertou magia...

            Lembro, certa vez, de me perder entre as arquibancadas de madeira do circo e, apavorada, procurar desesperadamente por minha mãe. Eu era pequenina e o susto, o medo e a ansiedade escureceram minha alma infantil neste dia. Senti-me perdida, frágil, confusa... imersa no mundo colorido e desconhecido do faz de conta...

            Foram segundos, minutos – ou foram horas (?) dizia meu coração despedaçado pela incerteza – e eu vaguei por entre a plateia animada, mal percebendo os gritos alegres, os rostos eufóricos de meninos e meninas lambuzados de algodão doce... Na minha ingenuidade dos cinco anos, pensei que jamais voltaria a reencontrar mamãe, os irmãozinhos e vovô! Nem mesmo a graciosa bailarina me oferecendo sua maçã do amor acalmara meu coração apertado, apertadinho que estava...

            Quando o espetáculo começou, eu estava sozinha, olhos úmidos, dentes rilhando, mãos suadas, e dando-me conta do inevitável: perdera-me definitivamente da minha família! E o circo parecia tão grande!

            Enquanto as gargalhadas explodiam sob a lona e as piruetas dos palhaços seduziam a multidão, senti que as lágrimas banhavam sem piedade o meu rosto...

            Transformei-me em pedra de gelo, estátua de sal, surda ao meu redor, sem vibrar, sem aplaudir, sem sorrir... então, fechei com força meus olhos e aguardei a morte chegar – dramática que eu era aos cinco anos!

            Afogada nessa solidão, não notei que alguém puxava levemente meus cachos castanhos:

            - Triste menina, por que chora?

            Estremeci e abri os olhos bem devagarinho, receosa do que poderia acontecer comigo.

            Então, deparei-me com a cara engraçada, muito redonda e vermelha de um palhaço serelepe. Engoli as lágrimas ligeiro e apenas murmurei, tímida:

            - Perdi minha mãe!

            O palhaço simpático fez olhar de espanto, torceu graciosamente os cantos da boca, sorriu e... rodou na minha frente, todo animado! Da sua mão esquerda, surgiu um ramalhete de flores brancas. Pensei que ele fosse mágico também!

            - Perdeu-se? Perdeu-se mesmo? Mas, olhe menina bonita, olhe, siga a direção que aponta estas flores... veja, quem lá está... sim, veja... sua mamãe naquela arquibancada, talvez muito preocupada com o seu neném! – e o palhaço quase jogou as flores para o alto, em um entusiasmo que me contagiou.

            Ele tinha razão, lá estavam mamãe, irmãozinhos e vovô! Como não os enxergara antes? Será que o medo a deixara tão cega que não conseguira vê-los?

            Esqueci de tudo nesta hora – tudo mesmo! - e corri para os braços de mamãe. Brilharam mil luzinhas... e, de repente, o circo se transformara em um carrossel encantado...  Não lembrei nem mesmo do amável palhaço que tão gentil me ajudara.

            Depois de algum tempo, já próximo ao término do espetáculo circense, entre risos e muitas pipocas, é que percebi um ramalhete de flores brancas caídas aos meus pés. Deus, eram as flores que o palhaço segurara em mãos anteriormente! Mas... como foram parar perto dela??

           

 

 

Eu nunca soube de que modo o buquê de flores brancas viera parar aos meus pés...

Eu nunca mais revi o alegre e gentil palhaço daquela tarde, mesmo voltando ao circo inúmeras vezes naquele verão...

E nunca mais me perdi em um circo...

E esta é uma história real da minha infância...

             

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